quarta-feira, 20 de maio de 2009

Desenvolvimento Sustentável - conceito: a base para o Design Sustentável
LEPRE, Priscilla Ramalho - MSc em Design

Quando me perguntam qual minha área de pesquisa e eu respondo Design, a pergunta seguinte é quase sempre a mesma: design do quê... de móveis, interiores, de moda?
Quando eu respondo - Design Sustentável, é praticamente inevitável a careta que vem depois: Design.. o quê?; Como assim?; Desculpa a ignorância, mas.... pode explicar?
E na maioria das vezes me vejo com uma bela tarefa nas mãos: explicar o que é Design Sustentável. E é compreensível pois, apesar das palavras design e sustentabilidade fazerem parte do cotidiano das pessoas, nem sempre é claro seu significado.

A palavra design é frequentemente utilizada pelo marketing para 'agregar valor' a produtos, como uma espécie de plus, de embelezamento, que normalmente significa 'pagar mais caro', sem ter uma noção clara do por e pelo quê. Já a palavra sustentabilidade geralmente nos remete à questões como a preservação do meio ambiente, salvação de espécies da extinção, diminuição da emissão de CO2, despoluição dos rios, reciclagem, responsabilidade social, etc.
Todos os pontos acima, entretanto, fazem parte de conceitos muito mais amplos e complexos, cujas definições eu apresento a seguir, de maneira não rigidamente acadêmica, contudo utilizando como base teórica as pesquisas realizadas para compor a parte inicial da minha dissertação de Mestrado em Design com foco em Design Sustentável, pela UFPR e defendida em 2008

Desenvolvimento Sustentável
  • Desenvolvimento é o ato ou efeito de desenvolver; série de etapas, acontecimentos ou ações que levam ao surgimento de algo ou à manifestação em todos os seus aspectos (...).
  • Sustentável é aquilo que se pode sustentar; capaz de se manter constante ou estável por um longo período. (FERREIRA, 2001).

O ser humano dispôs, desde sempre, dos recursos oferecidos pelo ambiente para promover seu próprio bem estar. Baseado em uma falsa sensação de abundância e de infinidade dos recursos naturais, não houve, durante muito tempo, preocupação com os limites da natureza. Historicamente, as primeiras elaborações textuais que tangem a questão da resiliência do planeta, ou seja, sua capacidade de auto-regeneração, foram feitas durante a Revolução Industrial. "O economista Thomas R. Malthus (1766-1834), no livro “Um Ensaio sobre a População” (MALTHUS, 1815), pontua que a agricultura é incapaz de prover alimento a toda a população, pois o crescimento da população mundial se dá em progressão geométrica, enquanto a produção de alimentos cresce em progressão aritmética (MALTHUS, 1992 p. 61-62). Também deste período, tem-se a observação feita por MARSH (1801-1882) no livro Man and Nature. Segundo o autor, “(...) a ação do homem sobre o mundo orgânico tende a subverter o equilíbrio original das espécies (...)” (MARSH, 1865, p.IV)" (LEPRE, 2008).

Estas observações são retomadas no Séc. XX, quando o ritmo da produção, ditado pelas rápidas evoluções tecnológicas ocorridas apartir do Séc. XIX, se somaram as necessidades da Primeira e Segunda Guerra Mundial, para gerar uma demanda sem precedentes de recursos naturais como matéria prima para a nascente sociedade de consumo em massa.

O aumento progressivo da população mundial, a fome, a redução de recursos não renováveis como o petróleo, desastres advindos da utilização de novas tecnologias, como os acidentes nucleares, a popularização da aviação civil e a chegada do homem à lua, criaram para um novo panorama sobre as reais dimensões do planeta Terra. Percebeu-se um mundo que não é formado de espaços isolados e imunes, mas sim, de uma trama complexa que une a todos e se baseia em um fino equilíbrio natural constatemente levado aos limites pelas ações humanas (MEADOWS ET AL, 1972; KAZAZIAN, 2005).

Esta consciência de finitude dos recursos naturais se contrapôs ao estilo de vida da sociedade moderna e como reação, a partir da segunda metade do século passado, surgiram diversos estudos sobre os limites do crescimento, dentre os quais destaca-se aquele publicado pelo Clube de Roma em 1972 (MEADOWS ET AL, 1972). A definição de desenvolvimento sustentável surge em 1987, quando a Comissão de Brundtland estruturou o Relatório Brundtland, conceitualizando desenvolvimento sustentável e suas três dimensões: ambiental, econômica e social. Abaixo é apresentado panorama cronológico de acontecimentos relevantes que contribuíram para o conceito.

Panorama da Evolução do Conceito de Desenvolvimento Sustentável - FONTE: LEPRE, 2008


Conforme pode-se ver na figura anterior, o conceito de desenvolvimento sustentável surgiu como reação a uma série de situações que colocaram as práticas da sociedade moderna em questionamento. A eminência de escassez de recursos e a quebra do equilíbrio ambiental coloca em check, também a sobrevivência humana. Portanto, o conceito de desenvolvimento sustentável é organizado sobre o ideal de preservação das espécies da fauna, flora e dos recursos minerais, essenciais à continuidade da vida sobre a Terra. É descrito da seguinte maneira:

  • O desenvolvimento sustentável tem como mote principal a busca por soluções que permitam que as gerações futuras tenham acesso aos recursos naturais em níveis semelhantes ao que temos no presente. Nesta visão antropocêntrica, busca-se a garantia da perpetuação das gerações humanas futuras. Segundo o WCED (1992) o desenvolvimento sustentável deve estabelecer o direcionamento de investimentos, a orientação do desenvolvimento tecnológico e mudanças institucionais da sociedade (WCED, 1987, p.24, RIO, 1992).
    O desenvolvimento, para ser sustentável depende do equilíbrio entre desenvolvimento econômico, bem estar social e preservação do meio ambiente (AGENDA 21, 2002). Estes três pilares, mantêm entre si, relações de trocas e de inter-dependência (KAREN; PARRIS; LEISEROWITZ, 2005).

Para manter este equilíbrio faz-se necessária uma mudança radical nos estilos de vida atuais e, portanto, a humanidade vive um paradigma, um momento de transição, no qual velhos padrões estão sendo revistos, abandonados ou reciclados e no qual novas soluções e novas alternativas estão sendo pesquisadas e propostas em todas as áreas do conhecimento. Para que estas mudanças sejam sólidas é necessário o comprometimento de todos os setores: governo, indústrias, serviços e da sociedade como um todo. O Design, dentro deste cenário, apresenta-se como um importante promotor de práticas mais sustentáveis, tanto junto a indústria quanto junto aos consumidores (MANZINI & VEZZOLI, 2005), assumindo um papel diverso daquele assumido até o momento.Os novos papéis do Design, dentro da sociedade Sustentável será apresentado na sessão seguinte.

Referências Bibliográficas

  • AGENDA 21. Plano de Implementação da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável. Disponível em:
    http://www.mma.gov.br/index.php?ido=conteudo.monta&idEstrutura=18&idConteudo=573
  • FERREIRA, Aurélio B. de Hollanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.
  • KAREN, Robert W; PARRIS Thomas M; LEISEROWITZ Anthony A. What’s is Sustainable Development: Goals, Indicators, Values and Practices. Journal Issues of Environment: Science and Policy of Sustainable Development. v.47, n. 3, p. 8-21, 2005.
  • KAZAZIAN, Thierry (org). Haverá a Idade das Coisas Leves. São Paulo: SENAC, 2005.
  • LEPRE, Priscilla Ramalho. DIRETRIZES PARA APLICAÇÃO DE DISPOSITIVOS POKA-YOKE NO DESIGN DE MOBILIÁRIO:
    Uma Estratégia para o Design Sustentável.
    Dissertação apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre em Design, Programa de Pós-Graduação em Design, Setor de Ciências Humanas, Letras & Artes, Universidade Federal do Paraná. Curitiba, 2008.
  • MALTHUS, Thomaz R. An Essay on the Principal of Population or A View of Its Past and and Present Effects on Human Happiness with an Inquiry into Our Prospects Respecting the Future Removel or Mitigating of the Evils which It Occasions. John Murray: London, 1815.
  • MARSH, George P. Man and Nature or Physical Geography as Modified by Human Action. New York: Charles Scribner, 1865.
  • MANZINI, Ezio; Vezzoli, Carlo. O Desenvolvimento de Produtos Sustentáveis: Os Requisitos Ambientais dos Produtos Industriais. São Paulo: EDUSP, 2005.
  • MEADOWS, Donella H. et al. The Limits to Grow. Reports of Clube de Roma: Roma, 1972.
  • PAPANEK, Victor. Design for a Real World: Human Ecology and Social Change. Chicago: Academy Chicago, 1985.
  • RIO DECLARATION ON ENVIRONMENT AND DEVELOPMENT in The United Nations Conference on Environment and Development. United Nations Environment Programms, Rio de Janeiro, 1992.
  • WCED. Report of the World Commission on Environment and Development: Our Common Future, 1984. Disponível em: www.un-documents.net/wced-ocf.htm
  • WHITELEY, Nigel. Design for Society. London: Reaktions Book, 1993.